sexta-feira, 7 de março de 2014

Até logo!!

E aquele dia chegou! 
Por mais que os Sanjoanenses estivessem preparados, nunca estariam, suficientemente, preparados. 
Quando o telefone tocou na véspera e me deram a notícia de que a situação não era nada animadora, senti um aperto no coração que eu não gostei. Meu ânimo para sair já não era dos melhores, mas mesmo assim, fui dar uma voltinha pelos arredores, só que alguma coisa estava estranha. 
Na manhã seguinte, o telefone da casa do meus pais não parava de tocar, fazendo com que eu acordasse apreensiva e esperasse pelo toque dos sinos. Não me levantei da cama.
Uma agonia muito forte ia aumentando a cada toque do telefone, até que os sinos começaram a tocar. Era um toque festivo e por alguns minutos eu me acalmei, afinal eu me encontrava na cidade "Onde Os Sinos Falam".
De repente o telefone toca mais uma vez, só que dessa vez junto com o toque fúnebre de todos os sinos de todas as igrejas e, então não tive mais como sair daquele pesadelo real.
Não foi necessário receber a notícia verbalmente, os Sanjoanense natos e de fé sabiam que acabavam de ficar órfãos do pai espiritual mais admirável da cidade dos últimos tempos. E não tive como conter o choro. Tudo estava aos prantos: os sinos, o coração, o céu, os "filhos". 
Naquele momento eu me levantei da cama e fui ver onde meu pai estava, mas ele já havia saído para uma das tarefas mais difíceis que ele lhe pediu. 
Enquanto isso, nós esperávamos escutando os sinos chorarem juntos, ainda sem acreditar que aquele pesadelo era sim, real.
Não havia palavras a serem ditas, só olhares de uma tristeza sem fim e abraços apertados.   
E fez-se silêncio, apenas o toque dos sinos! O coração batia acelerado e dolorido, as mãos estavam trêmulas e a única pergunta era: Por que, meu Deus?
Ele havia de ser eterno, em circunstância alguma nós nos prepararíamos para aquilo.
É sim um pensamento egoísta querer que ele ficasse entre nós, mas não sofrendo, porque ele jamais merecia sofrer, por nada. Um santo não pode sofrer! 
E eu pedia, bem baixinho à Deus para que ele acordasse e sorrisse como sempre. 
Como eu iria ficar sem as suas bênçãos?
E me passou um filme enquanto olhava aquele corpo imóvel.
Os pirulitos que me deu quando eu era criança de colo ainda. Aquelas latas lotadas de pirulitos coloridos: verdes, vermelhos, roxos... A cor do time de futebol que ele torcia - O Fluminense!!
O catecismo, a primeira comunhão, as confissões que não fiz com ele, as histórias que ele contava, as idas à casa paroquial sem motivo, apenas para dar um "oi", as festas religiosas que eu ficava na igreja "ajudando" em alguma tarefa e ele estava sempre lá, até antes de se tornar pároco emérito e muitas outras lembranças.
E me lembrei da última vez que o vi. Ele estava assistindo a um jogo da seleção brasileira e eu entrei na casa paroquial para que ele me abençoasse para eu voltar em paz para a minha casa. Fazia isso quase sempre. E ele sempre me abençoava em latim e me dava uma palavrinha de conforto e ânimo. 
E como eu poderei ir embora sem ser abençoada por ele? 
Foram bastante anos de convivência e nunca recebi uma repreensão se quer, nem quando entrava com uma roupa meio curta na casa dele. E tomava a sua benção todas as vezes que encontrava com ele. 
Teve com meu pai, uma amizade de 60 anos de convívio diário. 
Um carinho enorme pela minha mãe mesmo tendo a chamado de "preguiçosa". 
Não desfazia das pessoas. Tirou muitas da fome. Ajudou tantas outras e nunca deixou ninguém desamparado.
Fez milagres em vida pedindo sempre que confiássemos em nossa Mãe Santíssima! E a preferida dele era a Mãe do Pilar! 
E tudo aconteceu tão cronologicamente perfeito, neste último ano, fazendo com que todos os seus sonhos se tornassem concretos. 
A Capela do Divino Espírito Santo, a Beatificação de Nhá Chica, o Jubileu de Diamantes de Sacerdócio, as pregações feitas no ano de 2013 e o Setenário das Dores que deixou completamente pronto. (Que eu me lembro agora.).
E aquele que celebrou tantas missas para incontáveis fiéis, que confortou o coração de tantas pessoas, que escutou e perdoou os nosso pecados, que desceu o Cristo Morto por vários anos durante a Semana Santa mais tradicional do mundo, que recusou a ser bispo por humildade e que nunca quis ser o centro das atenções, estava ali, deitado em seu esquife, recebendo o carinho e reconhecimento dos seus filhos espirituais. 
Em vida também recebeu a gratidão do seu rebanho. Graças a Deus pudemos mostrar isso a ele!
E continuaremos sendo gratos por, simplesmente, tudo o que ele fez por nós e pelos mais necessitados. 
O nosso homem santo! 
E como eu disse, ele que celebrou tantas missas, agora recebia sua missa de corpo presente com choros contidos e incessantes, ao som das duas maiores orquestras da cidade, Orquestra Lira Sanjoanense e Orquestra Ribeiro Bastos, sob a regência daquele que foi um amigo e "filho" durante 60 anos, meu pai, que com o coração dilacerado aguentou firme até o final, quando o povo cantou junto o Hino dedicado à Nossa Senhora do Pilar, com a voz abafada pelo choro e salvas de palmas enquanto seu corpo seguia no esquife para ser sepultado. 
Sempre humilde e de uma fé inabalável!
O seu jeitinho tímido que não interferia no seu pulso forte para comandar uma diocese inteira está guardadinho na memória dos Sanjoanenses natos e os de fé. 
Seus passos apressados que no final dependiam de ajuda de um braço amigo para subir os degraus ficaram lentos, sua voz forte que até 3 domingos atrás entoava às "Vésperas da Igreja Católica" e o seu cântico de "Ave, Ave Maria do Pilar, antes morrer que pecar" já deixa uma saudade enorme, mas que por enquanto dói, só que com o tempo se transformará em saudade de lembranças reconfortantes.
Como disseram: "Monsenhor sempre foi apressado..."
Amado amigo Padre Paiva, olhe por nós aí do Céu, ao lado do Pai Eterno e Nossa Senhora do Pilar. Guie nossa caminhada e nos ensina a viver com a sua ausência física.
Estamos aguardando os seus "emails celestiais" como prometido. 
E não existe uma maneira de demonstrar o tamanho da nossa gratidão e carinho por tudo, pela sua santidade, pelas suas mãos confortantes, pelas suas bençãos e pelos seus ensinamentos. Não precisamos dizer mais nada, afinal agora o senhor, numa instância bem superior, sabe dos nossos anseios mais íntimos e de como somos gratos.
Nunca mais iremos cantar o Hino à Nossa Senhora do Pilar sem ter aquela emocionante imagem do dia 04 de Março de 2014. 
Um dia nos encontraremos para assistir ao "programa do Chaves" juntos e marcar uma peladinha ai no Céu, quero mesmo ver se o senhor é um bom goleiro.

Obrigada e até logo!!!

                           Foto: Kiko Neto

E essa será sempre a nossa imagem de saudade do nosso amado amigo Monsenhor Sebastião Raimundo de Paiva, o nosso Padre Paiva. Ele andado nos arredores da Igreja que escolheu como sua casa. E nós, seus filhos espirituais, sentiremos a sua presença eterna com muito amor.

"Virgem santa, Virgem Pia, luz formosa, claro dia
que à Terra São-joanense Te dignaste visitar.

Este povo, que a Ti agora, de teu amor favor implora
e Te aclama e Te bendiz abraçado ao teu Pilar.

Pilar sagrado, farol esplendente, rico presente de caridade,
Pilar bendito, trono de glória, tu à vitória nos levarás!

Cantai, cantai, hinos de honra e de louvor,
cantai, cantai à Virgem do Pilar"

Réquiem ætérnam dona eis, Dómine,
Et lux perpétua lúceat eis
Riquiéscat in pace.
Amen 

Bia Viegas

São João del Rei - Minas Gerais

Hino dedicado à Nossa Senhora do Pilar - São João del Rei/MG